sábado, 2 de abril de 2011

O pesadelo da memória pessoal


O que têm em comum um lote de cartões perfurados, um DVD padrão ou um “Blu-ray”, um filme em película de 8 ou 16 mm, uma fita de backup QIC-80, um compact flash e um disquete de 3 ½”? São todos estes instrumentos de memória pessoal (digital ou não). Claro que alguns moderníssimos e outros obsoletos e anacrônicos. Mas é exatamente aí que começa o pesadelo que quero discutir com vocês.
(cartão, DVD blue-ray, super 8, QIC-80, Compact Flash e disquetes)
(cartão, DVD blue-ray, super 8, QIC-80, Compact Flash e disquetes)
Quem usa PCs a 5 ou menos anos terá menor identificação com o problema que quero expor mas em pouco tempo já estará sofrendo do mesmo mal. Vamos retroceder um pouco no tempo. Nem precisa ser muito. Eu na época de faculdade, nos anos 80 usei por apenas um ano cartões perfurados. Fiz alguns programas em FORTRAN dos quais chegava a me orgulhar na época e por isso guardei estes cartões. Deparei-me com eles há alguns meses atrás. Que grande entulho inútil se transformaram. Jamais irei usá-los de novo, pois nem existem mais computadores para lê-los.

Voltando um pouco mais no tempo, meu avô tinha uma câmera de filmes (película) em 16 mm. Outro dia vi na casa de uma tia algumas latas destes filmes. Ela ainda conseguiu recentemente “telecinar” os filmes e hoje estes estão em fitas VHS. Esta mesma tia, por ser amante de filmes e vídeos, teve uma câmera Sony Betamax, que era o padrão em excelência técnica há muitos anos, que foi superado mercadologicamente pelo VHS.

Agora a pergunta “gancho” para o assunto principal : alguém tem dúvida que o padrão VHS está caindo em desuso e em mais alguns anos nem será lembrada, de forma semelhante ao também já morto LP de vinil? Quantas pessoas ainda têm pilhas de discos de vinil que vagarosamente vem recomprando em CDs?

(Disco de Vinil, fita Betamax e fitas VHS)
O que eu chamo de “memória pessoal” (às vezes digital e às vezes não) nada mais é que o acervo de informações e dados gravados em uma diversidade de mídias que temos ou tivemos a nossa disposição.Mais um exemplo, eu venho nas última semanas digitalizando meu acervo de fitas padrão Hi8, de uma filmadora analógica Sony pois percebi que a câmera que já tem 10 anos está ameaçando “abrir o bico” e se isso acontecer a única forma de eu ver os meus filmes domésticos será comprar uma filmadora compatível.

Talvez ainda se encontrem filmadoras Hi8 a venda, mas não deve ser fácil encontrá-las e hoje seriam produtos bem “low-end” (exatamente ao contrário de seu posicionamento em relação à época que a comprei), e custando valores próximos de câmeras digitais mais simples, que são infinitamente melhores. Vão sumir em um ou dois anos no máximo eu estimo.O mesmo caminho, a digitalização, terá a minha coleção de fitas VHS, pois talvez antes da extinção definitiva deste padrão, o mofo ou fitas quebradas me impediriam de desfrutar de seus conteúdos. Vão todas virar DVD também. São filmes de casamento, batizado de filho, coleção de Star Trek, corridas do inesquecível Senna e inúmeros filmes colecionados ao longo dos anos. Mais um pedaço de minha memória pessoal.
(fita Hi8, DVD comum e DVD Double Layer)
(fita Hi8, DVD comum e DVD Double Layer)
(ZIP 250, Jazz, PD Drive, DAT DDS4, QIC-80, TRAVAN e CDR)
(ZIP 250, Jazz, PD Drive, DAT DDS4, QIC-80, TRAVAN e CDR)
A minha escolha para salvar o meu acervo de Hi8 e VHS foi óbvia para este momento, os DVDs. Mas alguém aqui poderia me garantir com plena certeza que estes DVDs de hoje não serão iguais às latas de filme 16 mm de meu avô daqui a alguns vários pares de anos? Deveria estar usando DVDs Double Layer? Não posso esperar ter os DVDs Blu-ray disponíveis (inclusive caberem em meu orçamento) para fazer a minha operação de resgate. Mesmo que eu esperasse para usar o novo padrão de DVD quem me garante que este será o formato de maior longevidade? Sobre isso vide o excelente artigo do Piropo sobre a Guerra do DVD .

Usuários de câmeras fotográficas digitais também experimentam uma diversidade de padrões. Praticamente todos eles ainda vivos como Compact Flash, SD, Memory Stick etc. Neste caso o problema é menor, pois as fotos digitais acabam transitando para algum HD mais cedo ou mais tarde. Mas na hora de fazer o registro histórico, o backup da fotos, estas podem ir parar em uma destas outras mídias que mais cedo ou mais tarde poderão serem difíceis de serem lidas.

Se considerarmos ainda os diferentes dispositivos que tivemos à disposição para efetuar backups de algum tipo em passado recente a paranóia é ainda maior. Sem vasculhar muito em meus armários eu achei discos ZIP 100, ZIP 250, cartuchos Panasonic de um PD-Drive que tive, mídias JAZZ, fitas streamer QIC-80, alguns cartuchos TRAVAN, fitas DAT DDS4, CDs e CDRWs e dúzias de trabalhos irremediavelmente perdidos gravados em disquetes de 5 ¼(não tenho mais drive para lê-los).
(DLT, LTO, MO e AIT 8mm)
(DLT, LTO, MO e AIT 8mm)
A catástrofe só não é completa porque no meu caso essas mídias todas contêm backups de certo momento de meus dados, que vieram sendo migrados de HD para HD ao longo dos anos. Mas conheço pessoas que fizeram seus arquivos pessoais usando algumas dessas tecnologias, e não têm estes dados em seus PCs, dependendo da disponibilidade de algum drive que leia uma dessas preciosidades de museu. Fora as mídias que tenho em meu armário, sem pensar muito ainda posso me lembrar de algumas outras tecnologias ainda em uso como DLT, LTO, MO (magnetic optic cartridges) entre tantas outras que em futuro próximo irão também desaparecer das prateleiras.
(conjunto completo de acessórios para 16 mm - inclundo as "latinhas")
(conjunto completo de acessórios para 16 mm - inclundo as "latinhas")
Mas isso é tão sério que achei na internet um site chamado DRIVER’S MUSEUM que tenta ajudar as pessoas a fazer funcionar estes dispositivos que estão esquecidos no tempo.

Meu avô, com suas latinhas de película de 16 mm, contendo imagens de churrascos na fazenda, aniversários da família ou corridas de cavalos (que ele adorava quando era vivo), talvez tivesse menos problemas atualmente. Por serem analógicos estes anacrônicos filmes têm a desvantagem da qualidade inferior e estarem castigados pelo tempo. Mas como meu avô era muito conservador ele se manteve fiel às latinhas de filme por muitos e muitos anos. Ele poderia ter mudado para 8 mm ou para uma filmadora Polaroid que foi sensação nos anos 70, ou mesmo VHS no começo dos anos 80. Tendo somente um tipo de mídia fazer as conversões necessárias acaba sendo um pouco mais simples.

É!! A grande sabedoria de meu avô continua me influenciando e ensinando, mesmo na minha área de atuação profissional, absolutamente incompreendida por ele, anos depois de ele ter deixado este lado da existência. E viva as latinhas de 16mm!!



PS : este texto foi originalmente publicado em minha sessão de colunas no site FORUMPCs

6 comentários:

  1. Eu tive o mesmo medo de ver imagens preciosas da minha família se perderem nas fitas de câmeras de vídeo. Achei que a melhor solução fosse digitalizá-las e converter em algum arquivo tipo MPEG, MOV ou AVI, em vez de armazená-las em DVD. O backup é muito mais fácil e a compatibilidade retroativa provavelmente ainda vai durar dezenas de anos.

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  2. Oi Nandu o assunto é sério né?? Eu apenas me fixei no assunto mídias físicas. Mas imagine, será que teremos software que exibe JPEG em 30 anos?? Parece loucura pensar nisso hoje em dia, mas...
    Outro dia um amigo pulou miudimho para ler uns arquivos CDR de Corel Draw do começo dos anos 90 (entre 15 e 18 anos atrás)!!!

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  3. Grande Flávio,

    Tem que ver tambem a questão da durabilidade das mídias...
    Já experimentou pegar um Cd gravado a mais de 15 anos ? Recentemente fui fazer uma faxina nas minhas "memórias pessoais" e joguei grande parte desses CD´s.. uma pequena pressão num cd velho e ele soltava toda a pelicula... um desastre.
    Acho que, com a queda de preço de HD´s, o mais viavel é deixar em disco mesmo...
    Grande abraço e parabéns pelo FXReview !!

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  4. Xandó, gostei do seu artigo, mas necessito fazer duas correções, ambas referentes ao formato Blu-ray.

    A primeira delas com relação ao nome da tecnologia. Não se escreve blue-ray; o nome correto é Blu-ray. Quaisquer combinações diferentes de letras, hifens e maiúsculas/minúsculas estão incorretas. O mesmo vale para a sigla BR; Blu-ray é uma palavra só.

    Outro ponto: não existe DVD Blu-ray. DVD e Blu-ray são tecnologias completamente distintas que só possuem como semelhança o fato de serem mídias ópticas do mesmo tamanho (da mesma forma que um CD é diferente de um DVD). Quando você quiser mencionar a mídia Blu-ray, utilize apenas Blu-ray Disc ou simplesmente BD.

    Não me leve a mal; só quero que as informações divulgadas estejam as mais corretas possíveis.

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  5. Caro Ingsic obrigado por seu comentário. Já fiz as devidas correções apontadas por você no texto. E faça SEMPRE isso, é o que espero dos leitores, que colaborem com os textos com comentários e correções. OBRIGADO.

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  6. Caro Eugênio muito obrigado por suas palavras de apoio!! E o assunto que você tocou é MUITO SÉRIO!! Uma mídia que parecia ser "quase eterna" como um CD parece não ter uma fração da durabilidade imaginada!! Imagino quanta gente pode estar perdendo suas informações neste momento. Convém ressaltar que os CDs mais frágeis são estes gravados pelas pessoas (CD-RW ou DVD-RW)e não os CDs industrializados de músicas e filmes que passam por outro processo de fabricação. Usar HDs é uma boa ideia embora eles tenham outros problemas. Também têm vida útile "FORMATO"!! Quem será capaz de usar um HD não SATA em 5 anos!?!? Hoje em dia mesmo só placas mãe antigas têm estes conectores... É sério o problema.

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